quarta-feira, 20 de maio de 2009

Sobre outro dia


- Eu não te amo mais.

Sentiu uma forte pontada no estômago. Sem deixar de fixá-la nos olhos, apalpou a mesa à procura dos cigarros. Em, aparentemente, um segundo, já estava soltando a fumaça. Sem deixar de fixá-la nos olhos, uma lágrima solitária correu em desespero para a maçã de seu rosto. Olhou pra garçonete, que naquele momento passava perto da mesa observando se lhe faltava algo.

- Me vê mais um café.

Tremendo como nunca havia tremido na vida, deu uma longa tragada no cigarro como se estivesse buscando nele o ar que lhe faltava nos pulmões. Num instante de raiva, soltou a fumaça naquele rosto perfeito, lindo como aquele nascer do sol no verão do ano passado no Rio de Janeiro. Viagem bonita. Acabou de ir pra lista de lembranças a serem esquecidas.

- Tu não vai falar nada?

Pensou em xingá-la, pensou em dizer que a amava mais do que qualquer pessoa que já havia cruzado seu caminho, pensou que nunca existirá uma pessoa tão cruel ao ponto de convidar alguém para um café e dizer que não o ama mais. Quis beijá-la loucamente.

- Tá tudo bem?

Espero que essa tenha sido uma pergunta retórica.
Olhou no fundo de seus olhos procurando uma pontinha sequer de dúvida. Pensou em convencê-la de que aquilo era errado, de que era o maior erro de sua vida. Mas não o fez. Estava paralisado, queria lhe dizer todas aquelas coisas bonitas que nunca teve coragem. Como sempre, ela o intimidava. Até na hora do adeus era fria.

- Desde quando?

- Desde quando o que?

- Pô...

- Ah... Desde semana passada.

Semana passada? Como assim “semana passada”? Amor tem prazo de validade? O café estava frio. Vai ver foi ela... Riu.

- O que foi?

Gargalhou. Teve uma crise de riso. Todos ao redor o olhavam como se fosse louco. Ria, ria e ria. Estava ficando louco mesmo. Ria, ria, ria.

- Pára.

- HAHAHAHAHAHA!

- Pára!

- AHAHAHAHAHAHAHA!

- Eu vou embora.

- Vai! Vai que é o que tu sabe fazer melhor!

Levantou, puxou-a do banco fazendo-a levantar também e a beijou. Beijou-a sabendo que aquele seria o último beijo deles. Enquanto a abraçava, acariciando suas costas, sentiu que se deixou levar pelo abraço e parou de resistir. Era ela que o estava beijando agora.

- Pára tudo.

- O que foi?

Olhou pra ela e sorriu.

- Tá de brincadeira?

- Como assim?

- “Eu não te amo mais”? Conta outra!

Olhou pra ele e sorriu.

- É. Eu pensei que fosse conseguir, mas tu sabe que não sou uma boa atriz.

Sorriu e a beijou, sabendo que aquele não seria o último beijo deles.

No dia seguinte, lá estava ele, sorrindo: mesma lanchonete, mesmo horário, mesmo banco da mesma mesa, segunda caneca de café. Ela, não. Ela estava atrasada. Uma hora e treze minutos. Deve ter perdido o ônibus. Duas horas e 17 minutos. Duas horas e 19 minutos! Sentiu uma forte pontada no estômago. E então percebeu, depois de duas horas e 23 minutos, que ela era uma ótima atriz.

4 comentários:

Fábio Ricardo disse...

ouch!
que final mais doído!
qdo eu pensei q o texto era muito bom, na hora q eles se entenderam, descobri que podia ainda ser muito melhor, com um final desses.

Mas, por motivos pessoais, a frase que eu mais gostei (não?) foi:
- Vai! Vai que é o que tu sabe fazer melhor!

Lou disse...

ahahaha. Pois é. E ela vai mesmo! Danadinha. hahah.

Então, ainda bem que tu gostou. Esse era aquele que tava horrível. O final veio, assim, como quem não quer nada. (=

*=

Marcelo Labes disse...

putacaralho!!! (porque meio que não há mais nada pra dizer). :)

Fábio Ricardo disse...

os finais que vêm assim, como quemnão quer nada, normalmente são os melhores.




danadinha.
hahahaa